quarta-feira, 23 de junho de 2010

Presas produzem programa de TV

Um dos grandes desafios da sociedade atual é o abismo entre o cárcere e a vida extra muros. Esse abismo acaba corroborando para a desumanizarão dos detentos e permitindo o desrespeito aos seus direitos. Para tentar superar essa separação que cria um submundo prisional, os estudiosos da criminologia há tempos vêm sugerindo a criação de políticas/projetos que aumentem o diálogo entre cárcere e sociedade.
O programa TV CELA, surgido em 2009, é uma tentativa bem sucedida desse diálogo. O programa é gravado na Cadeia Pública Feminina de Votorantim (SP), que possui capacidade para 48 mulheres, mas abriga 150. O número já chegou a 240 em oito celas. Uma das lutas das presas é pela desativação da carceragem, por falta de condições mínimas.
As gravações ocorrem em uma espécie de gaiola, uma passagem para a área das celas. São quatro detentas que colaboram para sua produção. Iara, de 25 anos, é apresentadora. Camila, de 22, e Bianca, de 32, são produtoras, e Edicleusa, de 29 anos, é câmera do programa de TV.
"A intenção é usar os veículos de comunicação para levar às pessoas um entendimento maior do que é a carceragem e quebrar um pouco o estereótipo que se tem das pessoas que cumprem pena", aponta Werinton Kermes, coordenador do projeto.
Contudo, o conteúdo do programa não fica restrito ao mundo da detenção. As presas também abordam assuntos gerais que interessam à sociedade, como saúde, leis, trabalho e arte.
As reclusas já produziram sete programas de 30 minutos, da definição da pauta ao conteúdo. Cada programa tem um entrevistado, além de cenas do dia a dia das detentas de Votorantim, gravadas por elas mesmas. Entre os entrevistados, estiveram o prefeito de Votorantim, Carlos Pivetta (PT), os deputados estaduais Hamilton Pereira (PT) e Maria Lúcia Amary (PSDB), o delegado seccional de Sorocaba, José Augusto de Barros Pupin e o sociólogo Mario Miranda Junior, da Fundação Manoel Pedro Pimentel de Amparo ao Preso (Funap).
Os programas estão sendo veiculados na TV Votarantim, TV Com Sorocaba e outras 40 tevês comunitárias do estado de São Paulo. A TV Justiça também vai retransmitir o programa.
"Eu fico com uma câmera aqui dentro 24 horas por dia. Filmo de manhã, à tarde, até à noite, quando trancam a gente", descreve Edicleusa, câmera do TV Cela, em entrevista ao programa de TV "Jogo de Cintura".
Edicleusa conta que andava sem rumo e atribui ao projeto um novo direcionamento à sua vida. "Eu andava quietona, sem um plano pro futuro... Hoje eu já penso que se eu sair daqui, eu vou continuar com o programa", prevê. "Foi importante esse projeto entrar na minha vida". Para Iara, "a visão que nós temos lá da rua, que eu tinha quando estava lá antes de estar nesse lugar, é que tem pessoas horríveis, sem estudo, que demonstram agressividade, mas não é nada disso", considera.
O delegado José Augusto de Barros Pupin, que acompanhou o projeto enquanto trabalhava em Votorantim, relata que o programa "com absoluta certeza mudou a motivação, o respeito das presas com os funcionários, porque alguém está dando importância às pessoas que estão no cárcere". "Elas eram ignoradas, subestimadas. Agora as pessoas demonstram que elas são importantes com esse programa", avalia.
Nas palavras de Pupin, o TV Cela chama atenção da sociedade de uma forma positiva. "Resgata a dignidade da pessoa humana", reflete.
O programa melhorou até mesmo a resposta dos órgãos públicos às solicitações das detentas. "O processo de transferência é mais rápido, para conseguir atendimento médico também. Há um esforço das pessoas que administram a cadeia para ajudá-las", menciona Luciana Lopez, jornalista que auxilia voluntariamente as detentas.
O TV Cela dá continuidade ao programa de rádio "Povo Marcado", também realizado por detentas e coordenado pela mesma equipe de voluntários. O programa foi ao ar em 2007 e 2008. Documentário sobre o programa foi exibido em 28 festivais de cinema pelo Brasil, foi base para uma tese de doutorado na Alemanha e conquistou três prêmios, um deles no festival de Gramado, em 2009, na categoria vídeo-social.
O programa de TV recebe apoio de uma equipe de profissionais de comunicação voluntários, do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio (Ceunsp), que realiza a edição dos programas.
"A inclusão social das companheiras detentas nos motivou a apostar no projeto. A integração, a inclusão, refletem nossa visão de sindicato cidadão", explica Ademilson Terto da Silva, presidente dos Metalúrgicos de Sorocaba.



Fontes: Rede Brasil Atual e Folha de São Paulo
(YOMP)
*IBCCRIM

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Linguagem do texto deve ser acessível a todos

Diversas categorias profissionais têm por hábito a utilização de uma linguagem particular que, reunindo termos compreendidos apenas entre eles próprios, acabam por formar aquilo que se denomina de “jargão profissional”.
Uma das mais conhecidas é a classe dos operadores do Direito, formada por advogados, juízes, promotores, procuradores, e consultores jurídicos, entre outros. Mas, enfim, o que há de errado com essa linguagem própria? O problema é que, por força da tradição e dos costumes, a chamada linguagem jurídica acaba se tornando de difícil compreensão para o cidadão comum, que lê o texto, mas não consegue entendê-lo perfeitamente.
Os profissionais da área, por sua vez, acabam empregando essa linguagem sem refletir sobre esses efeitos nocivos; e há até quem considere que o estilo jurídico seria quase uma ferramenta, privativa dos integrantes da classe profissional. É um erro. De uns tempos para cá, muita reflexão tem sido feita, na tentativa de simplificar a linguagem forense, para torná-la mais clara para a maioria das pessoas. Afinal, sempre que escrevemos um texto, o objetivo é que a mensagem possa alcançar a todos que o lerem. Mas, nem sempre isso acontece.
É bom esclarecer que esse problema não existe só no Brasil. No final da década de 1990, iniciou-se na Inglaterra um movimento para descomplicar a linguagem jurídica, que lá era bem mais confusa do que aqui. O inglês jurídico (chamado de “legalese”) incorpora expressões do latim, do inglês arcaico, do francês e muitas da época da elaboração da Carta Magna (ano de 1215). A campanha vem dando tão certo que, hoje, a redação jurídica praticada na Inglaterra é muito mais clara e compreensível do que a dos Estados Unidos, que permanece recheada de expressões provenientes do latim e dos primórdios da common law.
Nos Estados Unidos também há muitas reclamações, porém lá a mudança está como aqui, ou seja, bem lenta, quase imperceptível. Na prática, nada vem mudando; o que há são apenas discussões e reflexões sobre a necessidade de simplificar e clarear a linguagem forense. É muito difícil derrubar costumes e tradições, que fazem parte da formação acadêmica dos profissionais.
Na Inglaterra, o movimento para essa mudança envolveu associação de juízes, tribunais, ordem dos advogados, faculdades de direito, revistas jurídicas, a imprensa, grupos organizados da sociedade civil, enfim, praticamente todo o país. Foram realizados congressos, seminários, palestras, manuais e apostilas, tudo para divulgar o benefício que poderia resultar de uma mudança dessa natureza.
Lá, num dos diversos manuais distribuídos, consta uma síntese dos problemas encontrados nos textos mais complicados, e que, obviamente, devem ser evitados, seja em inglês ou em português: a) frases e períodos muito longos (seja breve e direto); b) uso da voz passiva (sempre que possível, empregue o verbo na voz ativa); c) uso de verbos fracos (utilize verbos que caracterizem claramente a ação; d) emprego de palavras supérfluas, que, além de desnecessárias, tornam o texto mais longo; e) utilização de palavras e expressões abstratas (procure aproximar o texto da realidade, com palavras apropriadas para a situação); f) evite detalhes desnecessários (o excesso prejudica a clareza do texto); e g) sempre que possível, evite empregar expressões e termos técnicos conhecidos apenas pela categoria profissional (se não houver prejuízo, substitua por expressões de uso geral).
Por fim, o que se espera de um bom texto, seja ele jurídico ou não, é que seja claro, objetivo, conciso, que observe as regras gramaticais da língua, que evite palavras estranhas e expressões obscuras, para não dar margem a segundas interpretações, que empregue as palavras mais simples e adequadas à situação, e que vá direto ao assunto, sem voltas desnecessárias. A redação deve servir para esclarecer as situações, e não para torná-las mais confusas, ainda.


Fonte: CONJUR

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Investigação ineficiente é causa de erro judiciário

Nas últimas décadas, a Justiça Criminal tornou-se alvo de críticas e carecedora de credibilidade. Há um abismo entre a vontade popular e os instrumentos jurídicos sagrados que, no afã de proteger os inocentes, acabam evitando, por vezes, a condenação dos culpados. Quando um caso clamoroso aparece na televisão, é fácil julgar, principalmente porque o discurso acusatório é posto no volume máximo, enquanto os argumentos que lançam dúvidas sobre a culpa são jogados para debaixo do tapete. Absolvido o réu, há uma catarse geral e ninguém consegue entender o desfecho indesejado, restando como consolo apenas acusar o juiz que o absolveu.
Acontece que uma das maiores causas de erros judiciários no Brasil ainda é a investigação policial bastante ineficiente. Se o leitor estiver pensando na investigação de Primeiríssimo Mundo que foi mostrada à população no caso Isabella Nardoni, pergunte a qualquer delegado, promotor, advogado ou juiz se ele conhece algum outro caso, anterior ou posterior ao da menina morta no edifício London, em que tenham sido usadas técnicas tão avançadas de perícia criminal.
Se fossem empregados 10% dos meios de prova usados naquele caso, nossa Justiça já estaria ótima. A verdade é que, sobretudo nos casos de homicídio, as provas por excelência continuam sendo a confissão do acusado — obtida, em regra, sem a presença de advogado —, testemunhos de "ouvi dizer" ou, ainda, de pessoas que chegam a Juízo e desmentem o depoimento prestado à polícia.
Mesmo quando se trata de caso rumoroso, é bastante comum — é claro que existem exceções — a investigação se preocupar mais com uma resposta rápida para a sociedade do que com a descoberta real da verdade. Alguns casos são bastante emblemáticos dessa atuação policial, como o do Bar Bodega, no qual a polícia apresentou, em tom triunfal, à população a confissão de todos os acusados, provando-se depois que tudo não passou de uma grande farsa.
Se um promotor de Justiça não tivesse ido atrás para descobrir a verdade, ocorreria ali um erro judiciário gravíssimo, embora corriqueiro na Justiça brasileira. Se isso acontece a olhos vistos, é de imaginar o que não se passa em silêncio nas investigações que andam anonimamente pelos rincões do país.
Engana-se, por outro lado, quem pensa que investigação mal feita é privilégio de réus pobres e sem condições de contratar advogado. Sobretudo nos últimos anos, tornaram-se muito comum prisões espetaculares sem nenhum substrato jurídico aceitável, o que acabou levando muitos casos a morrerem na praia. Um caso emblemático foi o da prisão dos donos de uma conhecida cervejaria por crime de sonegação fiscal só com base em grampo telefônico, embora o Supremo Tribunal Federal não aceitasse mais, na época, inquérito por sonegação fiscal, o que dirá prisão, antes de esgotada a discussão tributária na esfera própria. A sensação é que se buscou acender com o clamor público a brasa que os elementos da investigação não conseguiam por si só fazer fumegar.
Quando o caso chega à Justiça, é fácil odiar o juiz responsável pela absolvição de alguém que a televisão ou os jornais apontavam como culpado. Pouca gente para para pensar que a absolvição é fruto de uma investigação fracassada, que não deu ao juiz alternativa senão inocentar o réu.
Sob este prisma fica um pouco mais fácil pensar que tipo de reforma queremos. Um Código de Processo Penal deve ser capaz de proteger o cidadão dos arbítrios estatais, ainda muito comuns na fase de investigação — daí ser louvável a proposta de criar um juiz de garantias só para zelar pelos direitos e garantias do réu na fase da investigação e outro para julgar o caso — e, ao mesmo tempo, apto a levar a bom termo a condenação de quem se provou a culpa. Algumas outras propostas previstas no projeto em trâmite no Senado, como a de dar ao réu a chance de confessar o crime em troca de receber a pena mínima, parecem ir exatamente na contramão do que se quer de uma Justiça melhor: parece preferir a resposta rápida à descoberta da verdade real. Neste ponto, ainda fica a dúvida: quem não confessar perde o direito à pena mínima? É a institucionalização da confissão extorquida.
Em outros pontos, a reforma parece desequilibrar ainda mais a balança da Justiça, colocando mais peso no prato onde estão as formas mais invasivas e preguiçosas de investigação criminal -— como o grampo telefônico, que passa a ser permitido em alguns casos num prazo máximo de até um ano ininterrupto — e limitando os meios de questionar abusos, com a restrição do uso do Habeas Corpus, que passa a ser admitido apenas para casos de prisão. É bom lembrar que a interceptação de conversas telefônicas é excelente instrumento de descoberta de crimes, mas deve ser apenas um meio para ser chegar a outras provas (para descobrir o cadáver, a fraude, o cativeiro), e não ser usada como uma prova em si mesma.
Hoje basta falar alguma coisa ao telefone para ser culpado de um crime, às vezes mesmo sem se ter certeza material da existência do delito. O absurdo é tão grande que falar ao telefone se tornou mais incriminador do que confessar um crime na frente do delegado. Explica-se: o artigo 155 do atual Código de Processo Penal proíbe condenar somente com provas colhidas na fase de inquérito, de modo que a confissão a polícia, para ser válida, precisa ser confirmada na frente do juiz; já as conversas objeto de grampo, não. Vamos convir que são tempos estranhos estes que vivemos...
Com ou sem a reforma do código, enquanto os processos continuarem a chegar ao Judiciário absolutamente desprovidos de elementos probatórios válidos e seguros, as investigações mal feitas e ilegais continuarão sendo as maiores aliadas da impunidade.
[Artigo originalmente publicado na edição desta quarta-feira (16/6) do jornal O Estado de São Paulo.]

segunda-feira, 14 de junho de 2010

A justiça é composta também por dramas e histórias

A advogada Alexandra Lebelson Szafir lançou dia 31 de maio seu livro “Descasos – Uma advogada às voltas com o direito dos excluídos”. Escrito com o nariz, por causa da ELA, uma doença que como explica Alexandra Szafir “começou afetando minhas pernas, depois as mãos, os braços, as costas e, finalmente, a deglutição e a fala”, o livro é uma coletânea de histórias vividas durante quase duas décadas do exercício abnegado da profissão de advogada de defesa.
A obra possui dois méritos: o primeiro é o de escancarar as mazelas do nosso sistema penal e o segundo é o de ressuscitar um gênero esquecido na nossa literatura, a crônica forense. Neste último aspecto Alexandra Szafir ganhou lugar cativo na estante onde estão “Beca Surrada”, de Alfredo Tranjan, “Defesas que fiz no Júri”, de Dante Delmanto, “Reminiscências de um Rábula Criminalista”, do insuperável Evaristo de Moraes, sem falar dos obrigatórios “A defesa tem a palavra” e “Salão dos Passos Perdidos” do Ministro Evandro Lins e Silva e ainda o mais recente deles, “Nada mais foi dito nem perguntado”, do advogado Luis Francisco Carvalho Filho (se você lembrou também do John Grisham pedimos licença para parafrasear Veríssimo e implorar que pare imediatamente de ler este artigo).
A crônica forense deveria albergar mais prestígio do que vem recebendo ultimamente. É curioso como chegando à maturidade, os advogados preferem contar o que viveram em vez de fazer tratados sobre teses jurídicas. É porque sabem que as teses são indispensáveis ferramentas de trabalho, mas não é delas que é feita a justiça; a justiça é feita de seus homens e suas mulheres, sua gente, seus dramas e suas histórias, muito bem percebidas também em outras artes, como por Honoré Daumier na série “Les Gens de Justice”.
O esquecimento do cronista forense está de alguma forma relacionado com o descrédito atual da nossa Justiça. É como se a nossa Justiça, a cada dia mais técnica e professoral, tivesse perdido seu único elo com a sociedade, o seu interlocutor mais legítimo, o seu porta voz. Tradutor das simbologias e dos pormenores judiciais, coisa que Alexandra Szafir faz com maestria no livro “Descasos”, o cronista forense desmistifica a Justiça e seus protagonistas, percebendo a realidade que de fato importa por detrás dos complicadíssimos protocolos.


Fonte: CONJUR

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Celeridade de julgamentos requer modernização


Com a Emenda Constitucional 45/2004 foi inserido no artigo 5, da Constituição Federal, que trata dos direitos e garantias e individuais, o inciso LVXXVIII, que assegura “a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
Este é o maior desafio da Justiça no Brasil, em geral.
Diversas são as causas. A legislação processual não se modernizou na mesma velocidade em que a demanda explodiu, com o maior acesso à Justiça, acompanhado de uma conscientização mais incisiva da população mais desfavorecida, a qual, antes, não procurava o Judiciário. Por outro lado, os serviços judiciários nacionais, em diversos casos, não acompanharam o crescimento de seus próprios serviços na proporção em que a demanda aumentava assustadoramente, inviabilizando, na prática, muitos Juízos, em função do movimento mensal de ingresso de novas ações ser tal, que os cartórios das Varas e os Juízes não são capazes de suportar a gestão dos milhares de processos em curso.
Há a necessidade de investimentos pesados em informática, para diminuir a quantidade de papel e burocracia. Apostar na melhor gestão judiciária, onde o Juiz passa a assumir um papel, também, administrativo e gerencial, mais ativo na condução e acompanhamento do cartório e de seu Juízo em geral, além de suas tarefas ordinárias de Julgador.
Paralelamente, o Sistema de Juizados Especiais, criado a partir da Lei 9.099/1995, com os Juizados Especiais Cíveis, os Juizados Especiais Federais a partir de 2001, e, agora, com a Lei 12.153/2009, a criação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, cuja norma entra em vigor no final deste mês, são normas que demonstram a possibilidade de um caminho em busca da celeridade, simplicidade, oralidade e economia processual; basta ver que em 1997, no Rio de Janeiro, foram ajuizadas cerca de 50 mil ações nos Juizados Especiais Cíveis e, em 2009, este número ultrapassou 750 mil ações, o que exigiu, diga-se, enorme esforço do Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro, seja em volumosos recursos financeiros, seja em um plano gerencial permanente, para enfrentar tamanho desafio, em Justiça Gratuita, por força da própria Lei, que é basicamente procurada por aqueles que, realmente, nada podem pagar.
A nova Lei dos Juizados da Fazenda Pública é um alento para este setor da Justiça; permitirá, provavelmente, que as atuais Varas de Fazenda Pública se tornem viáveis, com julgamentos em tempo razoável, como determina a norma constitucional, viabilizando o acesso à Justiça, nos Juizados de Fazenda, de demandas represadas, hoje não propostas pelo rito processual ordinário demorado a ser seguido e pela ciência da situação de esgotamento administrativo das atuais Varas, fruto do grande excesso de processos existentes.
De qualquer forma, fundamental o Projeto de reforma em andamento do Código de Processo Civil, sob a Presidência do Ministro do STJ, Luiz Fux, o que já é uma garantia de qualidade do que será apresentado, vez que o Ministro Fux é, sem favor, processualista que orgulha o Direito Brasileiro, sendo que o Projeto, certamente, incorporará mudanças, as quais encurtem o tempo do processo, diminuam o número de recursos hoje existentes, transformem o rito do processo em algo mais célere, em geral, facilitando a vida dos jurisdicionados e dos operadores do direito, sem atropelar o devido processo legal e o amplo direito de defesa, mas sem se olvidar, ao final, do objetivo primeiro, que é modernizar e acelerar o andamento dos processos como um todo, pois este é o fim a ser buscado.
Dar, enfim, efetividade e instrumentalidade à norma constitucional posta no artigo 5, LXXVIII, exige a implementação real do Sistema dos Juizados Especiais, nos Juizados Cíveis, nos Juizados Federais e, agora, nos novos Juizados da Fazenda Pública, que é a Justiça de massa, gratuita, que atinge, em primeiro plano, os mais necessitados; investir em modelos gerenciais modernos, ancorados nos instrumentos da informática, treinando melhor os servidores e o Juiz, também, em papel mais ativo de gestão cartorária e acompanhamento de seu Juízo; e, ao final, aperfeiçoar constantemente a legislação em vigor, visando modernizar e simplificar as normas, com o intuito de garantir a célere, real e verdadeira Justiça.

Fonte: CONJUR

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Conselho discutirá situação de filhos de presas


Preocupado com os filhos de presas em condições inadequadas nos presídios femininos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu incluir o assunto na sua pauta de discussões. Na próxima semana, dia 15 de junho, um grupo de juízas de cinco estados vai se reunir em Brasília para avaliar as diretrizes do Poder Judiciário sobre a questão.  As juízas são de São Paulo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Bahia, Acre e Minas Gerais e o grupo será coordenado pela juíza Morgana Richa, conselheira do CNJ. "As crianças não têm a atenção necessária porque a prisão de mulheres é tratada de forma global, dentro da população carcerária", explicou o juiz Luciano Losekann, auxiliar da presidência do CNJ.  Segundo ele, as mulheres presas precisam ter mais atenção do sistema prisional.
Dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça mostram que a população carcerária feminina no Brasil hoje é de 24.292 mulheres, a maioria com idade entre 18 e 24 anos. Ainda segundo o Depen, 50% delas foram presas por tráfico de drogas. Muitas chegam grávidas na prisão onde têm seus filhos, mas na maioria das penitenciárias dos estados ainda não há berçários ou creches onde as crianças possam acompanhar as mães presas de maneira adequada. Em muitos casos, os filhos ficam dentro das celas, sem espaço específico para eles; e, além disso, boa parte é submetida às mesmas condições e horários das detentas, seguindo as regras dos presídios.
No Brasil, a Lei de Execuções Penais estabelece que crianças devem ser mantidas em creches dentro dos presídios até os sete anos. Tempo considerado demasiado na opinião do juiz Losekann. Por isso essa questão será outro ponto em discussão. A separação abrupta de mães e filhos nessa idade pode ser traumática e um problema a ser analisado pelo grupo de juízas.

Agência CNJ de Notícias

STJ autoriza inclusão de matéria jornalística em processo criminal


A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou legal a juntada de documentos por determinação do juiz, de ofício, nos autos de um processo criminal. Entre os documentos estão cópias de denúncias, decretos de prisão preventiva e matérias jornalísticas publicadas em dois jornais de Londrina a respeito da investigação do tráfico de drogas no estado do Paraná.



A inclusão desses documentos no processo havia sido solicitada pelo Ministério Público, com o intuito de demonstrar que o réu seria chefe de organização criminosa do tráfico de drogas. Como o pedido foi julgado intempestivo (apresentado fora do prazo legal), o magistrado concedeu a ordem de ofício, com base no artigo 234 do Código de Processo Penal (CPP). Segundo esse dispositivo, se o juiz souber da existência de documento sobre ponto relevante da acusação ou da defesa, ele poderá providenciar sua juntada nos autos, independentemente de requerimento das partes.

A defesa do réu, acusado de homicídio qualificado e homicídio tentado (crimes praticados supostamente em razão da guerra do tráfico), impetrou habeas corpus no STJ contestando a juntada dos documentos. O relator, ministro Arnaldo Esteves Lima, destacou que o artigo 479 do CPP estabelece não ser permitida a leitura de documento ou exibição de objeto que não tenha sido juntado aos autos com antecedência mínima de três dias úteis e sem ciência da outra parte. No caso, essas exigências foram atendidas. Dessa forma, o relator entendeu que não há nenhuma vedação legal à apresentação de documentos que auxiliem a parte na sustentação de sua tese.
No julgamento, houve divergência entre os ministros apenas quanto à inclusão das matérias jornalísticas. O ministro Napoleão Nunes Maia Filho não vislumbrou necessidade jurídica de inclusão de reportagens nos autos. Ele ficou vencido. Os demais membros da Turma consideraram que a própria decisão contestada determinou que o Tribunal do Júri fosse alertado de que as matérias representam a opinião dos jornalistas e não depoimentos colhidos durante a instrução criminal.


Fonte: Universo Jurídico

terça-feira, 8 de junho de 2010

Reforma do processo penal será votada em sessão extraordinária nesta terça

A proposta de reforma do Código de Processo Penal (CPP)será votada pelo Plenário do Senado nesta terça-feira (8), em sessão extraordinária, às 10 horas. Essa foi a forma encontrada pelas lideranças partidárias para colocar projetos importantes em votação, já que a pauta segue trancada pelos projetos relacionados ao março regulatório do pré-sal, que tramitam em regime de urgência. A solução é a mesma usada na votação do PLV 3/10 , pelo qual são reajustados em 7,7% os benefícios dos aposentados que ganham mais de um salário mínimo e é extinto o fator previdenciário.
O código a ser alterado tem quase 70 anos e trata das regras processuais de natureza penal. A reforma do CPP (Decreto-Lei 3.689, de 1941)começou a se desenhar, no Senado, em 2008, quando uma comissão de juristas analisou o tema e apresentou um anteprojeto. A motivação foi a de modernizar a legislação, tornando os processos penais mais ágeis, e, ao mesmo tempo, dar mais garantias para os réus e para as vítimas.
O presidente do Senado, José Sarney, encampou o projeto, que passou a tramitar como o PLS 156/2009 . Foram anexadas à proposta outras 48, que passaram a ser analisadas conjuntamente. No âmbito da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), foi criada a Comissão Temporária de Estudo da Reforma do CPP. O senador Renato Casagrande (PSB-ES) foi o relator. Ele apresentou um substitutivo, aprovado pela CCJ. O texto, com 702 artigos, prevê grandes modificações no processo penal brasileiro.
Direitos de réus e vítimas
O texto que vai à votação no Plenário traz inovações como a criação da figura do juiz de garantia, a ser responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos fundamentais do acusado. No CPP atual, um mesmo juiz participa da fase de inquérito e profere a sentença. Com as mudanças, caberá ao juiz das garantias atuar na fase da investigação e ao juiz do processo a tarefa de julgar. No caso de júri, o texto permite, ao contrário do que ocorre hoje, que os jurados conversem uns com os outros, a não ser durante a instrução e o debate. O voto de cada jurado, porém, continuaria sendo secreto.
A vítima, que atualmente não conta com a atenção do Estado, passaria a ter direitos como o de o de ser comunicada da prisão ou soltura do suposto autor do crime; da conclusão do inquérito policial e do oferecimento da denúncia; e do arquivamento da investigação e da condenação ou absolvição do acusado. Além de ter amplo acesso ao desenrolar do processo e de poder manifestar-se sobre ele.
O projeto altera regras relacionadas às modalidades de prisão, que ficariam limitadas em três tipos: flagrante, preventiva e temporária. O uso de algemas, ou de emprego de força, só poderia se dar se indispensável: em casos de resistência ou de tentativa de fuga do preso.
Também há no texto preocupação em preservar a privacidade da vítima, das testemunhas e do investigado, limitando a exposição dessas pessoas pelos meios de comunicação.
Fonte: Agência Senado

domingo, 6 de junho de 2010

TJ da Paraíba elabora lista tríplice para escolha de novo integrante

Fachada TJPB - Ednaldo Araújo
O Pleno do Tribunal de Justiça da Paraíba vai elaborar, na sessão administrativa de quarta-feira (9/6), a lista tríplice, composta por advogados, da qual sairá o futuro desembargador da Corte, pelo quinto constitucional, na vaga do desembargador Marcos Souto Maior, aposentado. A sessão começa às 9h. A escolha final caberá ao governador José Maranhão.

Na quarta-feira (2/6), o presidente do TJ-PB, desembargador Luiz Sílvio Ramalho Júnior, recebeu a lista sêxtupla elaborada pela seccional da OAB na Paraíba, entregue pelo presidente da OAB-PB, Odon Bezerra. A relação é formada por José Ricardo Porto, mais votado, Caius Marcellus de Araújo Lacerda, Celeide Queiroz e Faria, Elson Pessoa de Carvalho, Francisco Freire de Figueiredo Filho e Levi Borges Lima.
De acordo com a Lei de organização Judiciária do Estado (Loje), em seu artigo 13, parágrafo 5º, o governador terá um prazo de 20 dias, após o envio da lista tríplice, para a escolha do novo desembargador. Com informações da Assessoria de Imprensa do  TJ-PB.
*Foto por Ednaldo Araújo.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Novo CPC é chance de efetivar Direitos Humanos


Vem aí, e já não era sem tempo, o novo Código de Processo Civil brasileiro, capitaneado pela cultura ímpar e reconhecido talento e vanguardismo do eminente Ministro Luiz Fux, do colendo Superior Tribunal de Justiça, consagrado em jurisprudência memorável.

Desnecessária qualquer observação demorada sobre o ponto, é por todos sabido, em quaisquer ordenamentos jurídicos do globo terrestre, que os códigos de processo civil traduzem-se em diplomas incomparáveis, regedores do delineamento e solução procedimental da maioria esmagadora das demandas ajuizadas na busca por justiça. Afinal, certamente não são os delitos, os crimes e contravenções, a maior fonte de criação, modificação e extinção de direitos em uma vida em sociedade.

Despede-se o vetusto Código Buzaid de 1973 sem deixar saudade na memória daqueles que propugnam pela prevalência dos direitos humanos, pela molecularização de litígios, pela efetividade da tutela dos direitos coletivos fundamentais lato sensu, entre outras questões sociais e demandas afetas a uma inchada sociedade de massa, aonde se busca com todo vigor e incessantemente a preponderância do interesse público, coletivo ou social sobre o interesse marcadamente individual e patrimonialista.

Entretanto, da mesma forma como então se deu com o Ministério Público no ainda vigente CPC, deve, agora, no novo Diploma Processual Civil que se avizinha ser reservado à Defensoria Pública um capítulo próprio, dispondo sobre a atenção e zelo com que os juízes, tribunais e auxiliares deverão dispensar a essa crescente e fortalecida Instituição Democrática permanente, representativa da maioria esmagadora dos feitos que tramitam no Poder Judiciário deste País, com suas próprias nuances e peculiaridades, inerentes sempre às dificuldades e dissabores vividos pelo pobre de tudo.

Hoje, a Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicialmente, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados.

A promoção dos direitos humanos e a defesa em todos os graus dos direitos coletivos é atividade sagrada, dentro da perspectiva de que a República brasileira, integrante da Organização das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos, é comprometida na ordem interna e externa com a dignidade da pessoa humana e com a prevalência e efetividade dos direitos humanos.

Após profunda reformulação e revolução legislativa federal, foram edificados como objetivos da Defensoria Pública a primazia da dignidade da pessoa humana e a redução das desigualdades sociais; a afirmação do Estado Democrático de Direito; a prevalência e efetividade dos direitos humanos; e a garantia dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

Torna-se a Defensoria Pública, destarte, Instituição de vocação e atuação, judicial e extrajudicial, incomparável, protagonista de envergadura representativa sublime, no escopo da promoção do bem-estar e busca da felicidade de milhões de brasileiros, mitigando-se cada vez mais a dor e desespero do povo deste País, silenciado por décadas passadas que não deixaram recordações nas lembranças dos amantes das liberdades e garantias fundamentais instaladas com o advento da Carta de Outubro de 1988. Ao pobre a preclusão, ao rico a execução, este é o lema da lei processual de outrora, mas ainda vigente.

O processo de redemocratização do Brasil traz consigo, naturalmente e como consectário, o processo de fortalecimento da Defensoria Pública. Não há mais possibilidade de retrocessos. O tempo conspira, e o povo não pode mais esperar. Lembrando o saudoso neto de Seu Januário, o filho do querido Gonzagão, “a gente não tem cara de panaca, a gente não tem jeito de babaca”. É, as coisas mudaram. Mudaram para melhor, na esteira da promessa feita por doutor Ulysses no seu discurso antológico de proclamação da nova Constituição Federal de 1988 naquela sessão inesquecível do Congresso Nacional.

Aqui, um reconhecimento, o Congresso Nacional tem feito de tudo para promoção e efetivação da dignidade e resgate das necessidades do povo humilde brasileiro, com o fortalecimento das Defensorias Públicas no sistema de direito positivo. Ao contrário de algumas poucas Assembleias Legislativas que ainda teimam em preservar o cenário processual elitista estático e cruel do século passado. Nas sábias palavras do incansável e corajoso Senador Renato Casagrande (PSB-ES), quando da aprovação da Nova Lei Orgânica da Defensoria Pública Nacional, “o Ministério Público e a Justiça já estavam sendo constantemente fortalecidos, o que não vinha acontecendo com a Defensoria Pública”. Fortalecer a Defensoria Pública é iluminar o povo necessitado, retirando-o da escuridão jurídica, da ausência de justiça e de um mínimo existencial cristão. 

O novo Código de Processo Civil será tabuleiro do povo brasileiro, dando-se um xeque-mate na propriedade que não exerce sua função social, no abuso do poder econômico, na omissão do Poder Público e na devastação de nossos recursos naturais. Será algo com começo, meio e fim, diploma antenado com a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, sem promover a desigualdade de armas. A atual codificação de 1973 é instrumento para quem pode esperar, para o despreocupado com a entrega da prestação jurisdicional.

Estão escancaradas as portas da democracia. É um caminho sem volta. 

São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras, prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus; promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos; promover a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico; prestar atendimento interdisciplinar, por meio de órgãos ou de servidores de suas carreiras de apoio para o exercício de suas atribuições; exercer, mediante o recebimento dos autos com vista, a ampla defesa e o contraditório em favor de pessoas naturais e jurídicas, em processos administrativos e judiciais, perante todos os órgãos e em todas as instâncias, ordinárias ou extraordinárias, utilizando todas as medidas capazes de propiciar a adequada e efetiva defesa de seus interesses; representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, postulando perante seus órgãos; promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes; exercer a defesa dos direitos e interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e dos direitos do consumidor, na forma do inciso LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal; impetrar Habeas Corpus, Mandado de Injunção, Habeas Data e Mandado de Segurança ou qualquer outra ação em defesa das funções institucionais e prerrogativas de seus órgãos de execução; promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela; exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado; acompanhar inquérito policial, inclusive com a comunicação imediata da prisão em flagrante pela autoridade policial, quando o preso não constituir advogado; patrocinar ação penal privada e a subsidiária da pública; exercer a curadoria especial nos casos previstos em lei; atuar nos estabelecimentos policiais, penitenciários e de internação de adolescentes, visando a assegurar às pessoas, sob quaisquer circunstâncias, o exercício pleno de seus direitos e garantias fundamentais; atuar na preservação e reparação dos direitos de pessoas vítimas de tortura, abusos sexuais, discriminação ou qualquer outra forma de opressão ou violência, propiciando o acompanhamento e o atendimento interdisciplinar das vítimas; atuar nos Juizados Especiais; participar, quando tiver assento, dos conselhos federais, estaduais e municipais afetos às funções institucionais da Defensoria Pública, respeitadas as atribuições de seus ramos; executar e receber as verbas sucumbenciais decorrentes de sua atuação, inclusive quando devidas por quaisquer entes públicos, destinando-as a fundos geridos pela Defensoria Pública e destinados, exclusivamente, ao aparelhamento da Defensoria Pública e à capacitação profissional de seus membros e servidores; e, ainda, convocar audiências públicas para discutir matérias relacionadas às suas funções institucionais.

Outrossim, essas funções institucionais da Defensoria Pública serão exercidas inclusive contra as Pessoas Jurídicas de Direito Público, suas autarquias, fundações e empresas públicas, até mesmo contra os desleais administradores e agentes surrupiadores da coisa pública, quando sujeitos à ação por improbidade administrativa ou à ação civil pública. Também, o instrumento de transação, mediação ou conciliação referendado pelo Defensor Público valerá como título executivo extrajudicial, inclusive quando celebrado com a pessoa jurídica de direito público. Ora, o Poder Público, sem nenhum átimo de dúvida, é o maior demandado na Justiça. Será, assim, a Defensoria Pública a proteção e mola propulsora ativa da efetivação desses direitos.

Por muito menos, à época, o ultrapassado CPC de 1973 convidou o Ministério Público a ter assento neste Códex da Ditadura Militar:

“LEI No 5.869, DE 11 DE JANEIRO DE 1973

TÍTULO III

DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Art. 82. Compete ao Ministério Público intervir:

I - nas causas em que há interesses de incapazes;

II - nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade;

III - nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte”.

Ora, quanto aos incapazes, a criança e o adolescente, o idoso, a pessoa portadora de necessidades especiais, a mulher vítima de violência doméstica e familiar e outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado, como os consumidores, por exemplo, a representatividade dos mesmos é levada a efeito pela Defensoria Pública, que passa atualmente a atuar inclusive como substituta processual dessa gente marginalizada ou esquecida. Não é por outro motivo que os Núcleos e Ofícios cíveis da Defensoria são o templo salvífico dessa gente, o último refúgio.

Nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade, é desnecessário dizer que é nas fileiras da Defensoria Pública que o povo tem acesso aos juízos de família, após incansável atendimento e confecção da preambular pelo seu Defensor Público, com a juntada dos documentos pertinentes, para posterior ajuizamento da ação. O Defensor da Vara de Família, aqui uma homenagem, é um herói. Defensores de renome do País no tema do novo Direito de Família e suas transformações, como o nome de Olga de Almeida Marques, serve de magistral modelo de um novo ideal de acesso à justiça, a partir da certeza de um atendimento técnico ímpar à um decesso à justiça com extrema judiciosidade até a última Instância judicial. 

Pelo que, nesta breve síntese, a olhos vistos, percebe-se que faz-se imprescindível, senão obrigatório, o reconhecimento da Defensoria Pública como Instituição essencial à função jurisdicional cível no ordenamento positivo, dedicando-lhe, neste passo, Capítulo reservado à consolidação deste entendimento no novo Código Fux. Conhecemos bem a magistratura brasileira de piso, na sua generalidade: “Doutor, em que artigo está isso?”.

Fazendo minha a lapidar lição da Eminente e Culta Ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha, da Suprema Corte brasileira, o império da lei não tem mais lugar no Estado Democrático de Direito material, pois neste o que se adota é o Império da Justiça, sob cuja égide ainda se forma e se informa a ordem jurídica contemporânea. A legalidade não é cogitada, pois, senão com o significado de ser aquela que veicula a materialidade da Justiça concebida e desejada pelo povo de um Estado, segundo suas necessidades e aspirações. A dimensão do Estado haverá que ser, pois, a desta Justiça realizadora do bem de todo o povo, da universalidade das pessoas que o compõem, mais, ainda, sem prejuízos graves ou fatais para toda a humanidade, pois não poucas vezes, agora, os interesses públicos não são apenas locais, mas transnacionais, como ocorre quando se cuida de meio ambiente, saúde e, especialmente, direitos humanos.

O Novo CPC deve atender às aspirações e necessidades instrumentais dessa nova Defensoria Pública brasileira. Acabando-se definitivamente com esse modelo de piedade e dó, de redução do Defensor Público àquela desconfortável condição de submisso à vontade de juízes e serventuários, para transformá-lo, sim, definitivamente, em um padrão de respeito e consideração, sem sobressaltos de preclusões ou fórmulas processuais ortodoxas inaceitáveis para um defensor de massas.

Por todos, trago o próprio incomparável Eminente Ministro Fux, do Festejado Tribunal da Cidadania:

“A Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios setoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da República que destina especial proteção a dignidade da pessoa humana”.

É evidente, claro que uma demanda envolvendo dois grandes conglomerados empresariais do setor de siderurgia ou telefonia não guarda nenhuma sintonia instrumental com demanda judicial aonde o pobre busca frascos de insulina para não morrer ou uma ultrasonografia porque o aparelho do hospital na cidade está quebrado, para se salvar a vida do nascituro. 

O novo CPC, de uma vez por todas, não deve ser um diploma monegasca. Deve estabelecer uma liturgia contemporânea ao seu povo e às questões sociais do Brasil, sob pena da necessidade de termos que ter dois Códigos de Ritos, ou, num futuro próximo, transformarmos o novíssimo CPC em colcha de retalhos, uma vez que a afirmação expressa da Defensoria Pública nesse Diploma será inevitável. Então, que se aproveite o momento. A hora é essa. Calemos Ovídio na sua máxima “curia pauperibus clausa est”, para abrir as portas da Justiça aos vulneráveis.

CARLOS EDUARDO RIOS DO AMARAL Defensor Público do Estado do Espírito Santo.
Fonte: CONJUR